TRT reconhece culpa concorrente por acidente fatal com trabalhador de 19 anos

A 2ª Turma do TRT de Mato Grosso reconheceu tanto a culpa de uma fazenda, localizada na região de Pontes e Lacerda (440km a oeste de Cuiabá), quanto de seu trabalhador pelo acidente que matou o rapaz de 19 anos.

Ele tinha como função o abastecimento dos tratores e a diluição dos venenos para a lavoura de soja. No dia do acidente, fez o primeiro preparo por volta das 7 horas, momento em que o trator pulverizador foi abastecido e seguiu para a plantação. Como de praxe, permaneceu no local aguardando o retorno do veículo para reabastecê-lo, o que demorava cerca de 40 minutos. Mas quando o tratorista voltou, entrando de ré no local de manobra dos pulverizadores, atropelou o rapaz, que estava deitado no caminho e teve morte instantânea.

A decisão do Tribunal manteve a sentença proferida pela juíza Michelle Saliba, titular da Vara do Trabalho de Pontes e Lacerda, que julgou que tanto o empregador quanto a vítima contribuíram, concomitantemente, para o acidente. Trata-se da culpa concorrente, implicando assim em redução proporcional do valor da indenização. Com base nisso, a magistrada condenou a fazenda a arcar com a compensação de 50 mil pelo dano moral e uma pensão mensal, pelo dano material, levando em conta também a conduta da vítima.

Tanto a família do trabalhador quanto os representantes da fazenda recorreram ao Tribunal, pedindo a reforma da decisão. A primeira argumentando que o acidente decorreu de culpa da empregadora, que não deu os treinamentos necessários ao rapaz, além de ter exigido que ele trabalhasse os três dias anteriores ao acidente sem lhe permitir as horas legais de descanso. Essa, por sua vez, atribuiu o ocorrido ao descuido e desatenção do trabalhador, que teria gozado de folga e descansos e conhecia a rotina dos veículos no local, de modo que a culpa era exclusivamente dele.

A questão foi dirimida pela 2ª Turma do TRT mato-grossense, com base no voto do desembargador Roberto Benatar, relator do recurso.

De início, o magistrado salientou que em regra a indenização somente é devida quando presentes esses três requisitos: culpa ou dolo do empregador, dano para o empregado e nexo causal entre a lesão e as atividades desenvolvidas. No entanto, a obrigação de indenizar deixa de existir se ficar demonstrado de forma inequívoca que o dano ocorreu por culpa exclusiva da vítima.

A empresa apresentou provas de que o rapaz gozou dos intervalos previstos na legislação nos dois dias anteriores ao acidente, ocorrido em um quarta-feira, sendo que não trabalhou no domingo.

Os depoimentos também confirmaram que ele costumava deitar embaixo do tanque de abastecimento de veneno enquanto o operador do pulverizador estava aplicando o produto na lavoura, tendo sido advertido e alertado do ato inseguro, mas sem nenhuma mudança de atitude.

“O que se extrai do exposto, de imediato, é a total imprudência do de cujus em repousar no local utilizado para a manobra dos maquinários, atividade que, conforme as testemunhas, era de conhecimento da vítima, pois a presenciava, cabendo realçar que o alto risco da conduta é de fácil percepção a qualquer pessoa de mediana prudência e discernimento”, destacou o relator, que entendeu ser “absolutamente desnecessária a realização de curso ou treinamento com a finalidade de orientar os empregados acerca dos riscos da realização de atos de tal natureza, mormente na hipótese em que o obreiro já havia sido advertido por dormir em serviço”.

Por outro lado, avaliou que a empregadora, mesmo tendo conhecimento do hábito imprudente do trabalhador, foi omissa e não agiu para evitar o grave acidente. A ela cabia o dever de adotar medidas disciplinares para garantir o fim da conduta perigosa, por meio de penalidade como a suspensão ou mesmo a demissão por justa causa.

Assim, concluiu configurada a culpa concorrente das duas partes, confirmando a responsabilização civil da empregadora na proporção de sua culpa, pelos danos moral e material decorrentes do acidente fatal.

O relator lembrou que é inquestionável o sofrimento experimentado pela mãe do rapaz, autora do processo judicial, ao perder um filho em circunstância tão trágica. O jovem trabalhador ainda residia com a mãe, ressaltou o desembargador, cuja perda – tanto do eventual sustento que ele lhe proporcionava quanto do carinho de filho – “jamais poderá ser reparada, mensurada ou minimizada por dinheiro algum”.

Com relação ao valor da condenação, utilizou como base caso semelhante julgado pela 2ª Turma, que avaliou razoável o valor da indenização por dano moral em 90 mil reais a cada um dos familiares. No caso, considerando a culpa concorrente das partes, o valor foi fixado pela metade, ou seja, 45 mil reais.

Quanto ao dano material, ficou estabelecido que, em função de se tratar de família de baixa renda, o que atrai a presunção de dependência econômica em relação ao trabalhador, deverá ser paga pensão mensal de 2/3 do salário que ele recebia a sua mãe.

O pensionamento será devido até a data em que ele completaria 25 anos de idade, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao estabelecer que a relação de dependência econômica diminui no momento em que a vítima constitui sua própria família ou atinja a idade de 25 anos, quando, em tese, passa a custear a sua própria existência, não se presumindo o auxílio aos ascendentes a partir de então.

O voto do relator foi acompanhado de forma unânime pelos magistrados da 2ª Turma.

PJe 0000370-59.2016.5.23.0096

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho – 23ª Região

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